A primeira vez é sempre especial. Assim os dizem todos os clichés, ditados populares e até os virgens mentirosos.
A minha primeira vez foi também a do TS. Fomos encaminhados com cuidado pela experiência Laranjnha através deste novo percurso recheado de encantos luminosos e becos sombrios. De facto, apesar de mais novo, Laranjinha tinha já muito que contar...
Assim começou a minha primeira vez:
Acordei estremunhado. Dor de cabeça agonizante enrolava o meu cérebro como o deve ter feito a coroa de espinhos de Cristo. O estômago não estava em muitas melhores condições pois conseguia sentir o sabor da bílis a escalar pelo sistema digestivo.
Esforcei-me para respirar fundo mas os vapores nauseabundos que foram exalados durante a curta noite desencorajaram-me. Abri os olhos com cuidado para não traumatizar o frágil equilíbrio em que me encontrava. Eram 8 da manhã e tinha chegado às 5 a casa. As lembranças da madrugada surgiam agora como fotos que lentamente revelavam os seus segredos.
Musica de má qualidade, um ambiente húmido do suor, fumo em exagero e pronuncia brasileira... Exactamente! Tinha ido ao Populum a Braga. O maior lupanar de Portugal. Com uma análise mais atenta destas recordações deduzi que para ter ido a tal estabelecimento é porque então já estava fortemente embriagado antes de la entrar.
Ondas turvas de informação vinham ao de cima. Aperitivo, um jantar bem regado, digestivos, muita cerveja, bares e depois devo ter sido arrastado até à capital Galaica. Por esta altura já eu me tinha levantado, vencido os obstáculos que semeei às escuras quando tinha chegado (roupa, sapatos etc.) e estava a abrir o chuveiro deixando-me ir nesta estranha dimensão em que se encontram os ressacados que acordam aos trambolhões depois de uma noite muito curta e mal dormida.
Porque é que me levantei nesta manhã de Setembro? Bem, era o dia de ir de ir para Viana à procura de casa para o novo ano escolar. Podia ter-me esquivado e tão bem teria sabido o merecido descanso mas por qualquer motivo senti-me impelido para respeitar este compromisso anual. Assim, depois de removidas algumas toxinas através das fezes, urina e do banho, vesti-me, tratei de arranjar dinheiro e sai sem comer. Alimento de qualquer tipo era algo de intolerável naquele momento.
Encontrei-me com TS. como combinado e arrancamos na sua histórica viatura para o Alto Minho. A viagem, como tantas outras, foi calma e de poucas palavras pois um olhar foi suficiente para que TS compreende-se o drama interior pelo qual estava a passar.
A manhã passou-se rapidamente e decidimos-nos imediatamente pela casa do 2º ano. Sem história digna de se contar, almoçamos, deambula-mos um pouco pela airosa Viana e fomos embora com a excitante perspectiva de mais um ano escolar que se ia iniciar na semana seguinte. Ainda convalescente mas já perto de um estado a que se podia chamar vida, recordo-me de ouvir o TS propor passar-mos na terra de Laranjinha para convivermos um pouco e aproveitar a brilhante e amena tarde. Assim dito, assim feito e quando demos conta já lá estávamos.
A bucólica aldeia de Laranjinha, entalada entre vales e montes de curvas sugestivas tinha a engraçada particularidade de só ter cobertura de telemóvel por baixo da oliveira que fica na praça principal. Em frente à mesma encontravam-se 2 cafés que iam ter um papel decisivo para que a minha primeira vez assim como a de TS viesse a acontecer da forma imprevista como sucedeu. Laranjinha imediatamente escolheu a mesa na esplanada que ficava agradavelmente resguardada da ainda feroz acção do sol pelo típico edifício granítico.
Imediatamente, a pergunta que eu receava foi posta: "O que bebes?" Na verdade, depois de ter fingido almoçar para não revelar a todos a minha decadente situação, ouvir sequer a palavra beber causou-me distúrbios violentes nos intestinos. Por isso mesmo respondi: Um fino claro! Estúpido orgulho...
Os primeiros goles foram como arame farpado a a deslizar pela garganta rasgando o tecido à sua passagem. Segurei as lágrimas e esforcei-me para concluir este copo. Afinal já era um homem feito! Havia que deixar-se de mariquices infantis. Felizmente, o saber popular costuma ter fundos de razão. Quando se diz que para curar uma bebedeira, nada de melhor que começar a beber de novo, esta-se a falar a sério. Quando dei conta, estávamos a pagar 14 finos cada um em apenas 2 horas e ainda insisti em beber um Ricard como aperitivo. Esta teimosia foi a ultima machadada e levou-me de volta para a cova da qual tinha rastejado aquela manhã.
Enfiamos-nos na carrinha do TS e, completamente alcoolizados divagamos pelos caminhos do parque nacional brincando escandalosamente com as fundas ravinas esfomeadas. Escalamos escarpas para ver as lagoas e diz-se que fomos à ermida mas como não me lembro de tal não revelarei as cenas que dizem lá ter ocorrido.
Mais tarde, fomos jantar a Ponte da Barca. Caminho sinuoso, piorado pela obrigação de irmos 3 numa carrinha de 2 lugares. Santa inocência! 3 jovens semi-inconscientes em estradas minhotas, entalados uns em cima dos outros... Bons tempos!
Paramos no centro da vila e fluimos, tortuosos, para fora do carro até ao restaurante mais próximo. Cá fora liguei para casa a avisar que não ia comer a casa. Entramos e mandamos vir coca-cola geladinha e um bitoque cada um. No entanto, não sei se fora da coca-cola estragada ou da viagem atribulada, comecei a ver as paredes e o tecto a andar em espiral cada vez mais rapidamente. Não consegui permanecer mais tempo sentado e urgia sair dali. Tinha que ligar para casa a avisar que não ia comer pelo que aproveitei a oportunidade para me escapulir.
Cá fora ouvi um enorme raspanete da minha mãe pois, a repetição do telefonema levou-a a concluir o que ela já suspeitava. O seu filhos estava bêbado em lugar incerto. Perturbado pelas reprimendas deixei cair o telemóvel novo no rijo granito talhando na sua face prateada uma funda cicatriz comemorativa. Cada vez que viria a pegar nele lembrar-me-ia da primeira vez.
O Laranjinha comeu o meu bitoque visto que não estava em condições para sequer ficar sentado. Para descomprimir urinamos numa esquina enquanto conversava-mos acerca do nosso próximo destino. Demos conta, só no fim, que estava uma mulher a janela que se apresentava mesmo a nossa frente e ao nosso nível a olhar para nós divertida. Aproveitamos para lhe pedir sugestões.
Daí partimos para o parque à beira rio. Tomar um cafézinho e dar uma volta a pé só poderia fazer bem. O transe em que nos encontrava-mos e que no meu caso assemelha-va-se a um estado de hipnose, fez o jogo de luzes proporcionado pelos candeeiros, os reflexos do rio e as frondosas arvores, bastante sugestivos. Deitei-me na relva fresca e fechei os olhos. Só assim, em comunhão com algo de sólido em todo o meu corpo conseguia encontrar estabilidade mental.
Não sei quanto tempo passou. Senti algo em cima de mim. Como que mil dedos e mãos a arrastarem as suas unhas curvas pela minha face. Levantei-me com um salto e atirei o cano de carvalho alvarinho que não sei como tinha parado em cima de mim. Esta abrupta quebra do relaxamento deu origem ao inevitável. Vergue-me sofregamente e vomitei os excessos de agora 24 horas dos melhores tempos da minha vida. Estava assim concluída a minha oferenda a Nábia.
Vamos lá ouvi TS. Vamos a uma festa que há ali noutra terra. Mete-mo-nos os 3 dentro do habitáculo construido para 2 pessoas e lá fomos pela estrada de serpente até Ponte de Lima onde fizemos uma entrada em grande.
A sexta-feira anunciava-se fresca mas quilómetros do local em causa já centenas de carros faziam fila. Mais a frente eram milhares e ainda adiante as pessoas a pê pareciam grãos de areia comprimidos. TS, sempre pronto a mostrar as suas habilidades e esperteza ao volante, tratou de encontrar um atalho para uma zona em que milagrosamente poderiam haver lugares de estacionamento.
As ruas mais perto do centro da vila Limiana estavam repletas de de populares com concertinas e animação contagiante. O meu mal estar quase passava se não fosse TS distraído e/ou encantado pela profusão de cores, ter esquecido a rotunda que se apresentava a sua frente e ter pura e simplesmente atropelado a mesma passando por cima dela com estrondo. Estávamos agora oficialmente no espírito da festa.
A multidão opressiva era simplesmente inacreditável. A quantidade de música, cheiros e bebidas eram deliciosamente aterradoras. Lembro-me vagamente de nos sentarmos numa barraca e pedirmos um cachorro e um fino cada um. Entornei o copo que não tinha sequer, devido à letargia, visto a minha frente mas, por azar, a senhora muito simpática deu em outro. Levantamos-nos e fomos por este mar a dentro com comida e bebida nas mãos. Veio-me um flash. Espetei com o cachorro no chão, atirei o copo cheio para longe e proibi TS e Laranjinha de beber. Que raio estávamos nós a fazer? Protestei e tentei dissuadi-los porém eles disseram me que eu estava a ficar maluco e felizmente voltei a mim.
Direccionamos-nos para a rampinha... Ali vi o que julgava ser impossível. Não há palavras para descrever a folia desta festa. Milhares de pessoas com copos nas mãos a dançar ao som das concertinas na parte de baixo e das musicas reles da moda em cima. As ruas laterais eram utilizadas como latrinas e assemelhavam-se a enormes correntes de urina que desaguavam no lima. A patética quantidade de álcool e o delírio destas gentes era algo de gloriosamente macabro.
Subimos a custo as escadas empurrando a massa de gente que se comprimia e fiquei isolado dentro da minha própria cabeça. Não há melhor local para se encontrar só consigo mesmo do que no meio da multidão impessoal. Assim, com a ajuda do álcool que corria, pujante, nas minhas veias, entrei em harmonia com o espírito festivo.
Olhando para baixo, o fumo, a neblina, a beleza, a cor, o suor, o perfume, o som, o bom e o mau juntaram-se num só levando-me sublimemente numa elevação espiritual rara. Senti-me leve, feliz e, quando abri os olhos, por coincidência ou não, começou o fogo de artificio lançado desde a ponte sobre o Lima. Ao mesmo tempo, romperam-se as nuvens e a deusa libertou a sua fertilidade purificadora sob estes insignificantes seres. Dentro de mim as lágrimas correram por ter atingido tal nível de Karma a que muitos aspiram mas só os afortunados alcançam.
Estávamos agora à porta da casa de Laranjinha. Estava exausto e era me penoso estar sentado ou até existir. Só ter de respirar para manter as minhas funções vitais era um castigo horrendo. Laranjinha indicou a TS o melhor caminho para irmos para casa e por aí seguimos. Que erro! O caminho era terrível. Curvas e contracurvas. Via desfilar a paisagem a uma velocidade alucinante e não aguentava. Estava já com a cabeça de fora há algum tempo para que o ar fresco me revitaliza-se mas, a violência do caminho fazia com que me sentisse a desfazer por dentro.
-MAIS DEVAGAR - gritei aflito...
TS, estupefacto respondeu:
- O pá.. estou a ir a 30 Km/H...
Resignado, decidi desistir e morrer de ressaca se assim fosse necessário. Recuperaria o dia seguinte...
Dia seguinte!!! Uma arrepio gélido atravessou a minha mente. Eram quase 4 da manhã e daqui 2 horas tinha de me levantar para vindimar todo o dia....
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Assim foi a minha primeira vez nas Feiras Novas de Ponte de Lima..
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Autor: GMDC
A minha primeira vez foi também a do TS. Fomos encaminhados com cuidado pela experiência Laranjnha através deste novo percurso recheado de encantos luminosos e becos sombrios. De facto, apesar de mais novo, Laranjinha tinha já muito que contar...
Assim começou a minha primeira vez:
Acordei estremunhado. Dor de cabeça agonizante enrolava o meu cérebro como o deve ter feito a coroa de espinhos de Cristo. O estômago não estava em muitas melhores condições pois conseguia sentir o sabor da bílis a escalar pelo sistema digestivo.
Esforcei-me para respirar fundo mas os vapores nauseabundos que foram exalados durante a curta noite desencorajaram-me. Abri os olhos com cuidado para não traumatizar o frágil equilíbrio em que me encontrava. Eram 8 da manhã e tinha chegado às 5 a casa. As lembranças da madrugada surgiam agora como fotos que lentamente revelavam os seus segredos.
Musica de má qualidade, um ambiente húmido do suor, fumo em exagero e pronuncia brasileira... Exactamente! Tinha ido ao Populum a Braga. O maior lupanar de Portugal. Com uma análise mais atenta destas recordações deduzi que para ter ido a tal estabelecimento é porque então já estava fortemente embriagado antes de la entrar.
Ondas turvas de informação vinham ao de cima. Aperitivo, um jantar bem regado, digestivos, muita cerveja, bares e depois devo ter sido arrastado até à capital Galaica. Por esta altura já eu me tinha levantado, vencido os obstáculos que semeei às escuras quando tinha chegado (roupa, sapatos etc.) e estava a abrir o chuveiro deixando-me ir nesta estranha dimensão em que se encontram os ressacados que acordam aos trambolhões depois de uma noite muito curta e mal dormida.
Porque é que me levantei nesta manhã de Setembro? Bem, era o dia de ir de ir para Viana à procura de casa para o novo ano escolar. Podia ter-me esquivado e tão bem teria sabido o merecido descanso mas por qualquer motivo senti-me impelido para respeitar este compromisso anual. Assim, depois de removidas algumas toxinas através das fezes, urina e do banho, vesti-me, tratei de arranjar dinheiro e sai sem comer. Alimento de qualquer tipo era algo de intolerável naquele momento.
Encontrei-me com TS. como combinado e arrancamos na sua histórica viatura para o Alto Minho. A viagem, como tantas outras, foi calma e de poucas palavras pois um olhar foi suficiente para que TS compreende-se o drama interior pelo qual estava a passar.
A manhã passou-se rapidamente e decidimos-nos imediatamente pela casa do 2º ano. Sem história digna de se contar, almoçamos, deambula-mos um pouco pela airosa Viana e fomos embora com a excitante perspectiva de mais um ano escolar que se ia iniciar na semana seguinte. Ainda convalescente mas já perto de um estado a que se podia chamar vida, recordo-me de ouvir o TS propor passar-mos na terra de Laranjinha para convivermos um pouco e aproveitar a brilhante e amena tarde. Assim dito, assim feito e quando demos conta já lá estávamos.
A bucólica aldeia de Laranjinha, entalada entre vales e montes de curvas sugestivas tinha a engraçada particularidade de só ter cobertura de telemóvel por baixo da oliveira que fica na praça principal. Em frente à mesma encontravam-se 2 cafés que iam ter um papel decisivo para que a minha primeira vez assim como a de TS viesse a acontecer da forma imprevista como sucedeu. Laranjinha imediatamente escolheu a mesa na esplanada que ficava agradavelmente resguardada da ainda feroz acção do sol pelo típico edifício granítico.
Imediatamente, a pergunta que eu receava foi posta: "O que bebes?" Na verdade, depois de ter fingido almoçar para não revelar a todos a minha decadente situação, ouvir sequer a palavra beber causou-me distúrbios violentes nos intestinos. Por isso mesmo respondi: Um fino claro! Estúpido orgulho...
Os primeiros goles foram como arame farpado a a deslizar pela garganta rasgando o tecido à sua passagem. Segurei as lágrimas e esforcei-me para concluir este copo. Afinal já era um homem feito! Havia que deixar-se de mariquices infantis. Felizmente, o saber popular costuma ter fundos de razão. Quando se diz que para curar uma bebedeira, nada de melhor que começar a beber de novo, esta-se a falar a sério. Quando dei conta, estávamos a pagar 14 finos cada um em apenas 2 horas e ainda insisti em beber um Ricard como aperitivo. Esta teimosia foi a ultima machadada e levou-me de volta para a cova da qual tinha rastejado aquela manhã.
Enfiamos-nos na carrinha do TS e, completamente alcoolizados divagamos pelos caminhos do parque nacional brincando escandalosamente com as fundas ravinas esfomeadas. Escalamos escarpas para ver as lagoas e diz-se que fomos à ermida mas como não me lembro de tal não revelarei as cenas que dizem lá ter ocorrido.
Mais tarde, fomos jantar a Ponte da Barca. Caminho sinuoso, piorado pela obrigação de irmos 3 numa carrinha de 2 lugares. Santa inocência! 3 jovens semi-inconscientes em estradas minhotas, entalados uns em cima dos outros... Bons tempos!
Paramos no centro da vila e fluimos, tortuosos, para fora do carro até ao restaurante mais próximo. Cá fora liguei para casa a avisar que não ia comer a casa. Entramos e mandamos vir coca-cola geladinha e um bitoque cada um. No entanto, não sei se fora da coca-cola estragada ou da viagem atribulada, comecei a ver as paredes e o tecto a andar em espiral cada vez mais rapidamente. Não consegui permanecer mais tempo sentado e urgia sair dali. Tinha que ligar para casa a avisar que não ia comer pelo que aproveitei a oportunidade para me escapulir.
Cá fora ouvi um enorme raspanete da minha mãe pois, a repetição do telefonema levou-a a concluir o que ela já suspeitava. O seu filhos estava bêbado em lugar incerto. Perturbado pelas reprimendas deixei cair o telemóvel novo no rijo granito talhando na sua face prateada uma funda cicatriz comemorativa. Cada vez que viria a pegar nele lembrar-me-ia da primeira vez.
O Laranjinha comeu o meu bitoque visto que não estava em condições para sequer ficar sentado. Para descomprimir urinamos numa esquina enquanto conversava-mos acerca do nosso próximo destino. Demos conta, só no fim, que estava uma mulher a janela que se apresentava mesmo a nossa frente e ao nosso nível a olhar para nós divertida. Aproveitamos para lhe pedir sugestões.
Daí partimos para o parque à beira rio. Tomar um cafézinho e dar uma volta a pé só poderia fazer bem. O transe em que nos encontrava-mos e que no meu caso assemelha-va-se a um estado de hipnose, fez o jogo de luzes proporcionado pelos candeeiros, os reflexos do rio e as frondosas arvores, bastante sugestivos. Deitei-me na relva fresca e fechei os olhos. Só assim, em comunhão com algo de sólido em todo o meu corpo conseguia encontrar estabilidade mental.
Não sei quanto tempo passou. Senti algo em cima de mim. Como que mil dedos e mãos a arrastarem as suas unhas curvas pela minha face. Levantei-me com um salto e atirei o cano de carvalho alvarinho que não sei como tinha parado em cima de mim. Esta abrupta quebra do relaxamento deu origem ao inevitável. Vergue-me sofregamente e vomitei os excessos de agora 24 horas dos melhores tempos da minha vida. Estava assim concluída a minha oferenda a Nábia.
Vamos lá ouvi TS. Vamos a uma festa que há ali noutra terra. Mete-mo-nos os 3 dentro do habitáculo construido para 2 pessoas e lá fomos pela estrada de serpente até Ponte de Lima onde fizemos uma entrada em grande.
A sexta-feira anunciava-se fresca mas quilómetros do local em causa já centenas de carros faziam fila. Mais a frente eram milhares e ainda adiante as pessoas a pê pareciam grãos de areia comprimidos. TS, sempre pronto a mostrar as suas habilidades e esperteza ao volante, tratou de encontrar um atalho para uma zona em que milagrosamente poderiam haver lugares de estacionamento.
As ruas mais perto do centro da vila Limiana estavam repletas de de populares com concertinas e animação contagiante. O meu mal estar quase passava se não fosse TS distraído e/ou encantado pela profusão de cores, ter esquecido a rotunda que se apresentava a sua frente e ter pura e simplesmente atropelado a mesma passando por cima dela com estrondo. Estávamos agora oficialmente no espírito da festa.
A multidão opressiva era simplesmente inacreditável. A quantidade de música, cheiros e bebidas eram deliciosamente aterradoras. Lembro-me vagamente de nos sentarmos numa barraca e pedirmos um cachorro e um fino cada um. Entornei o copo que não tinha sequer, devido à letargia, visto a minha frente mas, por azar, a senhora muito simpática deu em outro. Levantamos-nos e fomos por este mar a dentro com comida e bebida nas mãos. Veio-me um flash. Espetei com o cachorro no chão, atirei o copo cheio para longe e proibi TS e Laranjinha de beber. Que raio estávamos nós a fazer? Protestei e tentei dissuadi-los porém eles disseram me que eu estava a ficar maluco e felizmente voltei a mim.
Direccionamos-nos para a rampinha... Ali vi o que julgava ser impossível. Não há palavras para descrever a folia desta festa. Milhares de pessoas com copos nas mãos a dançar ao som das concertinas na parte de baixo e das musicas reles da moda em cima. As ruas laterais eram utilizadas como latrinas e assemelhavam-se a enormes correntes de urina que desaguavam no lima. A patética quantidade de álcool e o delírio destas gentes era algo de gloriosamente macabro.
Subimos a custo as escadas empurrando a massa de gente que se comprimia e fiquei isolado dentro da minha própria cabeça. Não há melhor local para se encontrar só consigo mesmo do que no meio da multidão impessoal. Assim, com a ajuda do álcool que corria, pujante, nas minhas veias, entrei em harmonia com o espírito festivo.
Olhando para baixo, o fumo, a neblina, a beleza, a cor, o suor, o perfume, o som, o bom e o mau juntaram-se num só levando-me sublimemente numa elevação espiritual rara. Senti-me leve, feliz e, quando abri os olhos, por coincidência ou não, começou o fogo de artificio lançado desde a ponte sobre o Lima. Ao mesmo tempo, romperam-se as nuvens e a deusa libertou a sua fertilidade purificadora sob estes insignificantes seres. Dentro de mim as lágrimas correram por ter atingido tal nível de Karma a que muitos aspiram mas só os afortunados alcançam.
Estávamos agora à porta da casa de Laranjinha. Estava exausto e era me penoso estar sentado ou até existir. Só ter de respirar para manter as minhas funções vitais era um castigo horrendo. Laranjinha indicou a TS o melhor caminho para irmos para casa e por aí seguimos. Que erro! O caminho era terrível. Curvas e contracurvas. Via desfilar a paisagem a uma velocidade alucinante e não aguentava. Estava já com a cabeça de fora há algum tempo para que o ar fresco me revitaliza-se mas, a violência do caminho fazia com que me sentisse a desfazer por dentro.
-MAIS DEVAGAR - gritei aflito...
TS, estupefacto respondeu:
- O pá.. estou a ir a 30 Km/H...
Resignado, decidi desistir e morrer de ressaca se assim fosse necessário. Recuperaria o dia seguinte...
Dia seguinte!!! Uma arrepio gélido atravessou a minha mente. Eram quase 4 da manhã e daqui 2 horas tinha de me levantar para vindimar todo o dia....
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Assim foi a minha primeira vez nas Feiras Novas de Ponte de Lima..
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Autor: GMDC